O Depoimento de Geoffrey Jackson à Comissão Real Australiana: Um Marco na Análise das Políticas das Testemunhas de Jeová

O Depoimento de Geoffrey Jackson à Comissão Real Australiana: Um Marco na Análise das Políticas das Testemunhas de Jeová

Em agosto de 2015, Geoffrey Jackson, membro do Corpo Governante das Testemunhas de Jeová, compareceu à Comissão Real Australiana sobre Respostas Institucionais ao Abuso Sexual Infantil. Seu depoimento gerou repercussão global, trazendo à tona questões sobre como a organização lida com denúncias de abuso dentro de suas congregações.

O Contexto da Investigação

A Comissão Real Australiana foi estabelecida para investigar como diversas instituições lidam com alegações de abuso sexual infantil. Em sua análise, examinou a conduta de muitas organizações religiosas, incluindo as Testemunhas de Jeová. Documentos revelaram que, desde 1950, a organização havia registrado mais de 1.000 casos de abuso infantil na Austrália sem reportá-los às autoridades.

O Depoimento de Geoffrey Jackson

Geoffrey Jackson inicialmente tentou evitar testemunhar, alegando que seu papel no Corpo Governante era estritamente doutrinário. No entanto, quando compareceu, foi confrontado com perguntas diretas sobre a política da organização em relação a denúncias de abuso. Algumas das declarações mais marcantes incluíram:

  • A regra das duas testemunhas: Jackson reconheceu que essa política pode não ser suficiente em casos de abuso infantil, uma vez que tais crimes raramente ocorrem diante de testemunhas. No entanto, as publicações da organização sempre sustentaram que essa regra é um requisito bíblico inalterável, o que evidencia uma contradição.
  • Relato obrigatório às autoridades: Ele admitiu que não há impedimento bíblico para reportar abusos às autoridades. Contudo, as diretrizes internas da organização, conforme documentado em cartas e publicações, desencorajam os membros a procurar a polícia, preferindo que os casos sejam tratados internamente.
  • O papel do Corpo Governante: Jackson tentou minimizar sua responsabilidade, afirmando que as diretrizes sobre abuso não eram estabelecidas diretamente pelo Corpo Governante. No entanto, documentos internos e discursos da organização sempre reforçaram que o Corpo Governante é a única autoridade que orienta as políticas organizacionais, tornando sua afirmação evasiva e contraditória.
  • Mentiras e evasivas: Em certos momentos, Jackson negou conhecer detalhes sobre como a organização lidava com casos de abuso, apesar de registros mostrarem sua participação em decisões internas. Além disso, evitou responder diretamente a perguntas que poderiam incriminar a organização, recorrendo a respostas vagas e imprecisas.

As Implicações do Depoimento

A investigação revelou que as Testemunhas de Jeová mantêm registros internos detalhados de abusos, mas não reportam esses casos à polícia, o que pode colocar crianças em risco. O depoimento de Jackson e as evidências apresentadas pela Comissão ajudaram a pressionar a organização a revisar suas diretrizes. Sua postura evasiva e suas declarações contraditórias mostraram a dificuldade da organização em justificar suas práticas perante uma autoridade externa.

A seguir, comparamos algumas dessas declarações com as publicações oficiais da organização.

1. O Corpo Governante é o Porta-Voz de Deus?

  • Geoffrey Jackson (2015): Negou que o Corpo Governante seja o porta-voz direto de Deus, descrevendo-o como “um corpo de apoio”.
  • Publicação Oficial: A Sentinela de 15 de janeiro de 2001, p. 16, declara que o Corpo Governante é “o porta-voz de Jeová na Terra”.
  • Análise: A afirmação de Jackson suaviza o papel do Corpo Governante, enquanto a publicação oficial afirma sua autoridade divina.

2. Denúncia de Abuso Infantil

  • Geoffrey Jackson (2015): Disse que vítimas de abuso têm liberdade para procurar autoridades externas.
  • Publicação Oficial: Organizados para Fazer a Vontade de Jeová (2015), p. 131, desencoraja levar questões entre Testemunhas de Jeová aos tribunais.
  • Análise: As publicações sugerem resolver casos internamente, contrastando com a declaração de Jackson.

3. A Regra das Duas Testemunhas

  • Geoffrey Jackson (2015): Sugeriu que a “regra das duas testemunhas” poderia ser flexível em casos de abuso infantil.
  • Publicação Oficial: A Sentinela de 1º de novembro de 1995, p. 28, reafirma a necessidade de duas testemunhas para validar uma acusação.
  • Análise: As publicações enfatizam aplicação estrita, enquanto Jackson sugere uma abordagem mais flexível.

4. Inclusão de Mulheres em Decisões Judiciais

  • Geoffrey Jackson (2015): Disse que mulheres podem ser incluídas em certas decisões judiciais internas.
  • Publicação Oficial: A Sentinela de 1º de julho de 1992, p. 18, afirma que apenas anciãos tomam decisões judiciais.
  • Análise: A declaração de Jackson contrasta com a prática organizacional descrita nas publicações.

5. A Exclusividade da Organização

  • Geoffrey Jackson (2015): Negou que as Testemunhas de Jeová se considerem a única organização através da qual Deus se comunica.
  • Publicação Oficial: A Sentinela de 15 de novembro de 1981, p. 21, afirma que “somente essa organização funciona como o canal de Deus”.
  • Análise: Jackson minimiza a exclusividade da organização, enquanto as publicações reforçam essa crença.

6. O Corpo Governante Pode Errar?

  • Geoffrey Jackson (2015): Admitiu que o Corpo Governante é humano e sujeito a erros.
  • Publicação Oficial: A Sentinela de 1º de outubro de 1994, p. 8, sugere que o Corpo Governante é guiado pelo espírito santo e protegido de erros doutrinais graves.
  • Análise: Jackson adota uma posição mais humilde, enquanto a publicação sugere infalibilidade doutrinal.

7. A Regra das Duas Testemunhas e Abuso Infantil

  • Geoffrey Jackson (2015): Reafirmou que a regra pode ser interpretada de forma flexível.
  • Publicação Oficial: A Sentinela de 1º de novembro de 2012, p. 12, insiste que duas ou três testemunhas são necessárias.
  • Análise: As publicações mostram uma interpretação inflexível, contrastando com a visão de Jackson.

8. Buscar Ajuda de Autoridades Externas

  • Geoffrey Jackson (2015): Disse que as vítimas são livres para buscar ajuda externa.
  • Publicação Oficial: A Sentinela de 1º de novembro de 1998, p. 19, sugere resolver questões internamente primeiro.
  • Análise: A declaração de Jackson contradiz a prática descrita nas publicações.

9. Confidencialidade dos Casos de Abuso

  • Geoffrey Jackson (2015): Disse que a política de confidencialidade visa proteger a privacidade, não os abusadores.
  • Publicação Oficial: A Sentinela de 1º de junho de 1989, p. 18, enfatiza “absoluta confidencialidade”.
  • Análise: O sigilo promovido nas publicações pode dificultar denúncias, o que contradiz a declaração de Jackson.

10. Como a Organização Vê Pessoas de Fora?

  • Geoffrey Jackson (2015): Disse que as publicações não promovem a ideia de que pessoas de fora da organização sejam ruins.
  • Publicação Oficial: A Sentinela de 15 de fevereiro de 1979, p. 30, declara que “somente os que estão na organização de Deus serão salvos”.
  • Análise: As publicações reforçam a exclusividade da organização, enquanto Jackson suaviza essa visão.

Conclusão

As declarações de Geoffrey Jackson contrastam em vários pontos com as publicações oficiais das Testemunhas de Jeová. Essa divergência levanta questionamentos sobre a transparência da liderança da organização e a consistência de suas práticas. O depoimento de Geoffrey Jackson foi um momento crucial para a responsabilização institucional das Testemunhas de Jeová em relação à proteção infantil. Embora tenha evitado admitir falhas diretas, suas declarações deixaram claro que as políticas da organização precisavam de revisão. Desde então, o caso continua sendo um exemplo de como investigações independentes podem trazer à luz práticas questionáveis dentro de organizações religiosas.

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